terça-feira, 1 de novembro de 2011

MANIFESTO DO MIEIB EM DEFESA DA EDUCAÇÃO INFANTIL

Sonho que se sonha só
É só um sonho que se sonha só
Mas sonho que se sonha junto é realidade
In: Prelúdio - Raul Seixas

Por acreditar que podíamos sonhar com uma Educação Infantil de qualidade, nos unimos, movimentos populares; movimento de mulheres; educadores/as; estudiosos; gestores; políticos e famílias. Fruto de um trabalho intenso de diferentes atores sociais obtivemos importantes avanços na educação da criança pequena nas últimas décadas.
Tais mudanças se apóiam nos marcos legais, tais como, a CF/1988, o ECA/1990, a LDBEN N.9394/1996, o PNE - Lei 10.172/2001, a EC N. 53/1996 (FUNDEB); as DCNs da Pedagogia - Res. CNE/CP N.01/1996; EC N. 59/2009, que afirmam que a criança de zero a seis anos é um sujeito de direitos e indicam a construção de políticas que sustentem esta afirmação. Os avanços na construção teórica que embasa os conhecimentos pedagógicos orientam as ações de cuidado e educação das crianças pequenas, estando presentes na legislação atual para a área.
Cada um dos instrumentos legais citados, em determinado aspecto, evidencia os direitos das crianças pequenas a primeira etapa da educação básica, iniciada quando estas começam a frequentar espaços coletivos de educação.
Para normatizar especificamente esta etapa da educação há um arcabouço de documentos que dão suporte legal e orientam esta oferta educacional. Dentre estes, podemos citar alguns produzidos nas últimas décadas: os Referenciais Curriculares Nacionais (1998), o Parecer 022/98; as DCNs para a EI: Res. 01/1999, a Política Nacional de EI (2006); os Parâmetros Nacionais de Qualidade para a El (2006); as orientações para o conveniamento entre os municípios e entidades filantrópicas de EI; os Indicadores de Qualidade na EI; o Parecer 20/2009; as novas DCNs para a EI: Res. 05/2009, estes últimos construídos a várias, de maneira participativa, a partir de ampla pesquisa nacional.
Esse conjunto de documentos vem servindo de referência para a consolidação de práticas educacionais de maior qualidade, com tendência a garantir, progressivamente, o direto à aprendizagem e ao desenvolvimento integral das crianças, desde que acompanhados por políticas públicas adequadas e neles inspiradas. Já há algumas décadas, os municípios brasileiros vêm fazendo a transição das instituições envolvidas com o atendimento às crianças pequenas das áreas da saúde e/ou assistência para a educação, como ação que materializa as concepções contemporâneas sobre a criança e sua educação, em fase de consolidação do direito à criança pequena em nosso país.
Mas há muito ainda a fazer em termos de efetivação do direito, destacando-se a necessidade de um financiamento adequado para a efetivação dos padrões de qualidade já consensuados pela área. A formação de professores, tanto inicial quanto continuada é um desafio que vem sendo assumido pelos governantes nos últimos anos, com iniciativas em andamento como os cursos oferecidos pela Plataforma Freire e o Proinfantil.


Um outro grande desafio para as próximas décadas é a ampliação de vagas de forma a atender à demanda já existente e algumas ações já vêm sendo implementadas neste sentido, como o Proinfância, ainda que haja necessidade de um significativo aumento de vagas, que extrapola esta iniciativa, acompanhado de políticas de equidade, superando a exclusão de camadas menos privilegiadas socialmente, assim como grupos étnicos específicos.
Cabe ainda lembrar, as exigências decorrentes da implementação da EC 59/09, pois pensar na obrigatoriedade para as crianças de quatro a seis anos, implica não só em ampliação dos espaços, significa, também, não acelerar o processo de alfabetização incluindo crianças tão pequenas em classes de alfabetização ou do 1º ano do Ensino Fundamental e, ainda, em não reduzir a oferta de tempo integral às crianças de zero a três anos.
Sendo assim, é compreensível que na busca da integração de políticas que caminhem para a superação da miséria, surjam propostas de políticas para a primeira infância que foquem sua atenção para questões macro, que articulem áreas, saberes e poderes, pois sem dúvida, uma criança pequena não é apenas sujeito de direitos em relação à sua educação. Ela precisa de muito mais para exercer sua cidadania desde sempre, sem esperar um tempo “futuro” para ser alguém e exercer plenamente seus direitos. A criança de zero a seis deve ter seus direitos garantidos agora, de forma inadiável, porque este tempo de infância é único e não recuperável no futuro. É por isso que a educação infantil deve ser um tempo de viver a infância hoje, em sua plenitude, e não preparatório à educação fundamental, nem em caráter preventivo em relação a um vir-a-ser.
No entanto, há riscos importantes que não podemos correr neste processo de articulação de políticas. Um deles se refere ao retrocesso no sentido de focar políticas educacionais apenas na faixa etária atualmente obrigatória; negando o acesso à educação às crianças de zero a três anos na etapa de creche, rompendo a unidade pedagógica da educação infantil e retrocedendo em relação ao que já avançamos no entendimento de como uma criança pequena se relaciona com o mundo e suas oportunidades, de uma forma muito particular no início de sua existência, quando ela mais necessita de profissionais devidamente formados e atualizados e de espaços devidamente adequados às suas necessidades e potencialidades.
Outro risco que deve ser evitado, envolve a utilização junto às crianças de zero a seis anos de medidas de avaliação aos moldes de avaliações de impacto em larga escala, que já são utilizadas junto a crianças e jovens da educação básica, tentando aproximar o trabalho da educação infantil a modelos escolares rígidos e pré-determinados, de abordagem classificatória e, portanto, excludente. É sabido que este tipo de avaliação desconsidera o processo e os insumos de fato necessários para a oferta de educação de qualidade, além de direcionar programas e currículos em uma perspectiva de viés classificatório e pernicioso para os objetivos emancipatórios da educação que se fazem necessários na realidade brasileira.
Destaque-se que, em muitos casos, estas avaliações vêm acompanhadas de material didático de apoio à organização do trabalho docente, restringindo em muito o atendimento às especificidades regionais, locais e de cada grupo de crianças, conforme já comprovam algumas pesquisas na área. Há certos casos, em que as empresas privadas que oferecem esses materiais, claramente, os apresentam como preparatórios aos exames oficiais de avaliação de resultados, quando sabemos que estas avaliações desconsideram por absoluto as condições prévias e os insumos necessários a um melhor aproveitamento pedagógico de todas as crianças.



A conquista do reconhecimento da educação infantil como primeira etapa se deu com respeito à diversidade inerente a esta etapa da educação. Tal conquista deve ser defendida por todos nós, com a certeza de que as crianças brasileiras não precisam de modelos externos para a avaliação de seu desenvolvimento nem para a validação das práticas cotidianas que com elas são desenvolvidas. Temos no Brasil um arcabouço teórico e legal que nos permite avançar e prosseguir qualificando nossa educação com base em referências próprias. Os Indicadores de Qualidade na Educação Infantil (2008), documento construído a muitas mãos e largamente utilizando no território nacional é um exemplo de boas práticas a serem analisadas e ainda mais qualificadas.
Nos últimos anos, graças aos avanços das pesquisas sobre e com as crianças pequenas, é possível afirmar o lugar de centralidade que as mesmas assumem nas políticas e práticas envolvidas com sua educação. Hoje podemos, inclusive, perguntar as próprias crianças sobre como organizar melhor sua educação, pois as mesmas assumem lugar de protagonismo social como construtoras de cultura e agentes de seu próprio processo de aprendizagem.
Iniciamos dizendo que “Sonho que se sonha só, é só um sonho que se sonha só. Mas sonho que se sonha junto é realidade”. Acreditamos que podemos sonhar juntos, não queremos sonhar sozinhos, portanto investimento maior de recursos na educação infantil, em espaços qualificados, e na formação de seus professores, como fazem os países de primeiro mundo é um bom caminho a ser perseguido pelas políticas públicas nacionais que se querem democráticas e progressistas.


Outubro de 2011.

Maria Luiza Rodrigues Flores
Fórum Gaúcho de Educação Infantil

Maria Luzinete Martins Pereira Moreira
Fórum de Educação Infantil do Rio de Janeiro

Mariete Félix Rosa
Fórum de Educação Infantil de Mato Grosso do Sul

Marlene Oliveira dos Santos
Fórum Baiano de Educação Infantil

Rosilene Pachêco Quaresma
Fórum de Educação Infantil do Pará


Membros do Comitê Direito 2011-2012

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Pesquisar este blog