O impacto da violência doméstica contra crianças e adolescentes na vida e na aprendizagem

O IMPACTO DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA CRIANÇAS E
ADOLESCENTES NA VIDA E NA APRENDIZAGEM

Fabiane Klazura Rosas
Pedagoga. Concluinte do Curso de Especialização em
Psicopedagogia Clínica e Institucional – IBPEX
Maria Inês Gonçalves Dias Cionek
Pedagoga. Concluinte do Curso de Especialização em
Psicopedagogia Clínica e Institucional – IBPEX

RESUMO
Este artigo trata, como diz o título, do impacto da violência doméstica contra crianças e adolescentes na vida e na aprendizagem. Indagam-se quais as conseqüências para as vítimas desta violência doméstica, especialmente em relação à educação e aprendizagem. Conclui-se pela necessidade de se defender o direito constitucional da criança e do adolescente.

Palavras-chave: Violência doméstica. Crianças. Aprendizagem.

INTRODUÇÃO
As razões de nosso interesse pela pesquisa sobre a violência doméstica contra a criança e o adolescente foram decorrentes da necessidade de conhecer, de forma mais aprofundada, o fenômeno para, a partir de então, intervir nessa realidade, criando estratégias de análise para auxiliar pessoas que atuam diretamente com crianças e adolescentes, para que estes possam estar identificando casos e evitando um desfecho fatal ou traumático para as vítimas.
As conseqüências da violência doméstica podem ser muito sérias, pois crianças e adolescentes aprendem com cada situação que vivenciam, seu psicológico é condicionado pelo social e o primeiro grupo social que a criança e adolescente tem contato é a família. O meio familiar ainda é considerado um espaço privilegiado para o desenvolvimento físico, mental e psicológico de seus membros um lugar “sagrado” e desprovido de conflitos.
No entanto, para se chegar às raízes do problema da violência doméstica é necessário modificar esse mito de família, enquanto instituição intocável, para que os atos violentos ocorridos no contexto familiar não permaneçam no silêncio, mas sejam denunciados a autoridades competentes a fim de que se possam tomar providências.

A VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E OS DANOS PARA SUAS VÍTIMAS

É na relação em família que ocorrem os fatos mais expressivos da vida das pessoas, tais como a descoberta do afeto, da subjetividade, da sexualidade, a experiência da vida, a formação de identidade social. A idéia de família refere-se a algo que cada um de nós experimentamos, repleta de significados afetivos, de representações, opiniões, juízos, esperanças e frustrações.

Assim, falar de família é falar de algo que todos já experimentaram. É o espaço íntimo, onde seus integrantes procuram refúgio, sempre que se sentem ameaçados. No entanto, é no núcleo familiar que também acontecem situações que modificam para sempre a vida de um indivíduo, deixando marcas irreparáveis em sua existência, uma dessas situações é a violência doméstica contra a criança e o adolescente.
A violência doméstica pode ser definida como sendo:

“todo ato ou omissão, praticado por pais, parentes ou responsáveis contra crianças e/ou adolescentes que, sendo capaz de causar dano físico, sexual e/ou psicológico à vítima, implica numa transgressão do poder/dever de proteção do adulto e, por outro lado, numa coisificação da infância, isto é, numa negação do direito que crianças e adolescentes têm de ser tratados como sujeitos e pessoas em condição peculiar de desenvolvimento”. (AZEVEDO E GUERRA, 2001)

A criança e o adolescente são pessoas que estão em fase de desenvolvimento e para que isso aconteça de uma forma equilibrada é preciso que o ambiente familiar propicie condições saudáveis de desenvolvimento, o que inclui estímulos positivos, equilíbrio, boa relação familiar, vínculo afetivo, diálogo, entre outros.

Pois, como diz Weiss (2004, p.23):
“aspectos emocionais estariam ligados ao desenvolvimento afetivo e sua relação com a construção do conhecimento a expressão deste através da produção escolar (...). O não aprender pode, por exemplo, expressar uma dificuldade na relação da criança com sua família; será o sintoma de que algo vai mal nessa dinâmica”.


Partindo desse pressuposto, pode-se afirmar que um ambiente familiar hostil e desequilibrado, pode afetar seriamente não só a aprendizagem como também o desenvolvimento físico, mental e emocional de seus membros; pois, o aspecto cognitivo aspecto afetivo estão interligados, assim, um problema emocional decorrente de uma situação familiar desestruturada reflete diretamente na aprendizagem.

Para se compreender melhor esse aspecto, torna-se necessário discutir e analisar o impacto da violência doméstica contra crianças e adolescentes na aprendizagem e em outros aspectos da vida, uma vez que, é uma das situações mais degradantes e opressivas, pois, afeta profundamente a vida do indivíduo e a dinâmica familiar.

Com base em Guerra de Azevedo (2001), estudiosas do assunto, consideram-se aqui quatro tipos de violência:
- Violência Física - corresponde ao emprego de força física no processo disciplinador de uma criança, é toda a ação que causa dor física, desde um simples tapa até o espancamento fatal. Geralmente os principais agressores são os próprios pais ou responsáveis que utilizam essa estratégia como forma de domínio sobre os filhos.
- Violência Sexual - é todo o ato ou jogo sexual entre um ou mais adulto e uma criança e adolescente, tendo por finalidade estimular sexualmente esta criança/adolescente, ou utilizá-lo para obter satisfação sexual. É importante considerar que no caso de violência, a criança e adolescente são sempre vítimas e jamais culpados e que essa é uma das violências mais graves pela forma como afeta o físico e o emocional da vítima.
- Violência Psicológica - é toda interferência negativa do adulto sobre as crianças formando nas mesmas um comportamento destrutivo. Existem mães que sob o pretexto da disciplina ou da boa educação, sentem prazer em submeter os filhos a vexames, sua tarefa mais urgente é interromper a alegria de uma criança através de gritos, queixas, comparações, palavrões, chantagem, entre outros, o que pode prejudicar a autoconfiança e auto-estima.
- Negligência: pode ser considerada também como descuido, ausência de auxilio financeiro, colocando a criança e o adolescente em situação precária: desnutrição, baixo peso, doenças, falta de higiene.

De acordo com Azevedo (1997, p. 233):
As crianças vítimas de violência formam no Brasil um país chamado infância que está longe de ser risonho e franco. Nele vamos encontrar:
- infância pobre, vítima da violência social mais ampla;
- infância tortura; vítima da violência
- infância fracassada; vítima da violência escolar;
- infância vitimada, vítima da violência doméstica (...) todas elas compõem o quadro perverso da infância violada, isto é daquelas crianças que tem cotidianamente violados seus direitos de pessoa humana e de cidadão.

É pensando nessa infância violada, ou prestes a ser violada, que precisamos rever certos conceitos e estratégias de ação, pois a violência pode causar danos irreparáveis nos desenvolvimentos físico e psíquico de crianças e adolescentes. Muitas vezes, por tratar-se de um fenômeno polêmico que desestrutura o padrão familiar acaba sendo de difícil constatação, ficando assim, camuflado entre quatro paredes do que chamam de lar.

Quando se trata de violência doméstica, os agressores costumam contar com um aliado poderoso que é o silêncio das vítimas, assegurado por medo, vergonha, sentimento de culpa, por parte do agressor. É esse silêncio que faz com que se torne difícil a intervenção.
Portanto, o profissional que trabalha com crianças e adolescentes, principalmente em instituição escolar, precisa estar atendo aos sinais, pois as vítimas pedem socorro não só através de suas vozes, mas através da linguagem corporal,de ações e de comportamento que indicam que alguma coisa não está bem, e que a criança precisa de ajuda.

Com base em Guerra e Azevedo (2001), existe alguns indicadores orgânicos na criança e adolescente que nos mostram quando devemos desconfiar:
1. Casos de violência Física:
- Desconfia dos contatos com adultos;
- Está sempre alerta esperando que algo ruim aconteça;
- Tem mudanças severas e freqüentes de humor
- Demonstra receio dos pais ( quando é estudante procura chegar cedo à escola e dela sair bem mais tarde)
- Apreensivo quando outras crianças começam a chorar
- Demonstra comportamentos extremos: agressivo, destrutivo, excessivamente tímido ou passivo, submisso;
- Apresenta dificuldades de aprendizagem não atribuíveis a problemas físicos
- Revela que está sofrendo violência física

2. Casos de Violência Sexual:
- Interesses não usuais sobre questões sexuais, isto inclui expressar afeto para crianças e adultos de modo inapropriado para a idade, desenvolve brincadeiras sexuais persistentes com amigos, brinquedos ou animais, começa a masturbar-se compulsivamente.
- Medo de uma acerta pessoa ou sentimento de desagrado ao ser deixada sozinha em algum lugar ou com alguém;
- Uma série de dores e problemas físicos sem explicação médica;
- Gravidez precoce;
- Poucas relações com colegas e companheiros;
- Não quer mudar de roupa na frente de pessoas;
- Fuga de casa, prática de delitos;
- Tentativa de suicídio, depressões crônicas;
- Mudanças extremas, súbitas e inexplicadas no comportamento infantil
(anorexias, bulimias);
- Pesadelos, padrões de sono perturbados;
- Regressão a comportamentos infantis tais como choro excessivo, enurese, chupar os dedos;
- Hemorragia vaginal ou retal, cólicas intestinais, dor ao urinar, secreção vaginal;
- Comportamento agressivo, raiva fuga, mau desempenho escolar;
- Prostituição infanto-juvenil.

Deste modo, é preciso ter um olhar atento e comprometido com a causa da infância e adolescência para que nossas crianças possam obter auxílio e serem encaminhadas para profissionais éticos e capazes de fazer um diagnóstico mais preciso.

É muito importante, em casos de violência doméstica contra crianças e adolescentes, confiar na palavra da vítima, pois, dificilmente a criança vai mentir ou inventar. Então, até que circunstâncias mostrem o contrário, é fundamental acreditar na criança. Assim como, é importante prestar atenção em mudanças súbitas de comportamentos, elas podem ser o principal indicador de que algo está errado.

Os profissionais que atuam com o fenômeno da violência doméstica precisam estar comprometidos com a causa, fazer os encaminhamentos que forem necessários a fim de interromper o ciclo de violência, principalmente a fim de proteger a criança, pois, uma atuação inadequada pode comprometer seriamente a vida de uma criança a qual, na maioria das vezes, não tem condições de se defender da violência que lhe é imposta.

CONCLUSÃO
O diagnóstico da violência doméstica constitui-se em um desafio, principalmente por ser assunto complexo e polêmico, que afeta e altera toda a estrutura familiar. Por isso, muitas vezes os atos violentos ficam limitados a quatro paredes do que se chama “lar”, ou então, a violência é utilizada com pretexto para uma boa educação.
É importante enfatizar, como fazem Azevedo e Guerra (1998, p.25) que “toda a ação que causa dor física numa criança ou adolescente, desde um simples tapa até o espancamento fatal, representam um só continuum de violência". Sendo assim, torna-se necessário defender o direito constitucional de que crianças e adolescentes têm de estar salvas de toda forma de violência, crueldade e opressão para que tenham uma vida digna, enquanto pessoas em situação peculiar de desenvolvimento e enquanto seres humanos.

REFERÊNCIAS

ALMEIDA, Junior A. Problemas do ensino superior. São Paulo: Nacional, 1989.

AZEVEDO, Maria Amélia et all. Organização da Infância e Violência Doméstica: fronteiras do conhecimento. São Paulo, Cortez, 1997.

AZEVEDO, Maria Amélia e GERRA, Viviane Nogueira de Azevedo. Com licença vamos à luta.. São Paulo: Editora Iglu, 1998.

AZEVEDO, Maria Amélia e GERRA, Viviane Nogueira de Azevedo. Mania de bater: a punição corporal doméstica de crianças e adolescentes no Brasil. São Paulo: Editora iglu, 2001.
TRIVIÑOS, Augusto Nibaldo Silva. Introdução a pesquisa em Ciências Sociais: a pesquisa qualitativa em educação. São Paulo: Atlas, 1987.

WEISS, Maria Lúcia L. Psicopedagogia Clínica: uma visão disgnóstica dos problemas de aprendizagem. 10ª edição. Rio de Janeiro: editora DP&A, 2004.

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